quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Carta da Morte

POR BARBARA RIETHE

De mim para a personagem

Gostaria de me pronunciar pela primeira vez neste século. Gostaria de falar sobre todo meu amor enterrado, subjugado, duvidado tantas vezes. Bradam que eu não amo, me chamam até de tirana, vil e todas as alcunhas imagináveis. Ah, meus amores, eu sou inteira amor e zelo. Sinto como se toda humanidade tivesse saÍdo do meu ventre e acompanho, silenciosamente e de modo muito respeitoso, os passos de cada um dos meus filhos. É de mim que tudo começa e é em mim que tudo acaba ou recomeça. No meu beijo e abraço eu encerro o ciclo que o tempo ordenou. É ELE o tirano e vil! Ele que comeu os próprios filhos, que duramente risca tudo e entrega todos em meus braços, vitoriosos, esquecidos e cansados. Eu pacifico as revoltas d´alma, amenizando os castigos do Tempo e do Destino. Agora estou te seguindo, pra onde vais. Sei do que tens medo e do que te angustia - sei também do que guardas adormecido dentro do coração e que não podes deixar visto. Sei e te amo com todas as tuas faltas (as que fizestes e farás). Jamais te abandonarei... Estou, inclusive, te guiando para os lugares que deves ir. Só que tu não sabes que a moça que cruza a rua e te pede ajuda, ou aquele que te oferta um emprego e te faz mudar de cidade, ou aquele pássaro que voa um pouco mais baixo, te faz virar a cabeça, e notar o amor da sua vida...tu não sabes que sou eu. Estou te trazendo para meus braços e quando finalmente te ter, terás paz e descanso. Viver é muito cruel, às vezes. Sei da coragem necessária para amanhecer todos os dias. Tu és meu bravo guerreiro, que me dás forma e me faz existir e ter uma razão... Estou orgulhosa de ti, dos teus fortúnios e desfortúnios. Quando repousas a cabeça cansado, não orgulhoso do que és, perdido e cheio de dúvidas, sou eu que me deito ao teu lado. Estou pronta caso você venha até mim. Caso você queira pular do último andar da casa, eu te darei a liberdade. Te recompensarei te separando da vida e te entregando uma outra.

Experimento Cena 5 (19/08/2015)

Na última quarta-feira, fizemos um experimento da CENA 5 - A PARTIDA, penúltima cena da peça, baseada no conto Os Cativos de Longjumeau, de León Bloy.


(Um rádio está ligado, possivelmente uma vitrola antiga com algum disco francês. A luz vai crescendo aos poucos e revela o casal, cada um sentado de um lado da sala, encarando seu passaporte, fixo, segurando-o na mão. Malas prontas no canto.)


- Sabe que uma vez eu ouvi falar de uma mulher que queria tanto, mas tanto viajar (e, ao mesmo tempo, não podia, sei lá porquê) que se dividiu em duas. Uma ficou e uma viajou!



(trechos de FANTASMAGORIA CARNE, de Paloma Franca Amorim)
- fotos tiradas por Luiza Meira Alves no ensaio do dia 19/ago/2015 durante experimento cênico.

domingo, 23 de agosto de 2015

Experimento Cena 4 (03/08/2015)

A quarta cena da nossa peça é baseada no conto Casa Tomada, do argentino Julio Cortázar, e se chama IRMÃOS GÊMEOS. Segue algumas imagens do nosso experimento e tiradas durante um ensaio realizado no Tendal da Lapa.


- Eu estou sentada em uma cadeira que fica no corredor entre a realidade e o pântano. Mamãe, papai... Vovó, vovô... Eu e você aqui... Mantendo a casa limpa, distante da mácula do tempo. Quem envelheceu fomos nós. Essa necessária clausura da genealogia assentada por nossos bisavós na nossa casa.



- Também ouvi, ao mesmo tempo ou um segundo depois, no fundo do corredor que vai dar na porta. Eu me joguei contra a parede antes que fosse tarde demais, fechei-a de um golpe, apoiando meu corpo; felizmente a chave estava colocada do nosso lado e também passei o grande fecho para mais segurança.

(trechos de FANTASMAGORIA CARNE, de Paloma Franca Amorim)
- fotos tiradas por Luiza Meira Alves nos ensaios do dia 03/ago/2015 durante experimento cênico e ensaio.

Experimentos Cena 2 e 3 (26/07/2015)

No dia 26/07, um domingo comum, fizemos um ensaio-maratona, das 11h às 22h, em que estudamos e experimentamos duas cenas de Fantasmagoria Carne.

A primeira foi a CENA 2 - INSURREIÇÃO, escrita a partir do conto A Verdade sobre o caso de M. Valdemar, do norte-americano Edgar Allan Poe.


Figurinos dos personagens esperando para serem vestidos: Fantasmas de pó esperando pra se tornarem Fantasmas de carne. 


- Caros Doutores, podem vir agora. Os médicos consideram que não passará de amanhã à meia-noite; o calculo me parece correto. PJD.



- Depois de algum tempo em que se está nas peregrinações para o encerramento da vida, você se habitua a lidar com a morte como um bicho perigoso que, apesar de toda braveza, acompanha os seus passos silenciosamente e de modo muito respeitoso, sem tentativa de ataque. A morte não é traiçoeira como os homens. É como uma ave carnívora, um abutre, um urubu talvez, que espreita sua vítima e só a engole depois que o próprio tempo tenha feito sua parte. A morte não mata ninguém.

Depois, partimos para a CENA 3 - SOZINHA COM SUA ALMA, escrita a partir do conto homônimo de Thomas Bailey Aldrich. Uma mulher, depois de dormir quarenta anos, desperta e comemora com o marido 1 mês de vida.


- Uma mulher está sentada sozinha em sua casa. Sabe que não há mais ninguém no mundo: todos os outros seres estão mortos.



- Na volta do açougue, passava pelo parque para olhar as pombas. Nunca entendeu o ódio de alguns com as pombas. Levava farelo de pão no bolso para alimentá-las. Agora, nem elas existem mais, todas se extinguiram, assim como os gatos, ratos, cachorros, girafas, zebras, panteras e corvos, todos os animais estão mortos - a última barata ela matou anteontem. Até os vegetais estão parando de crescer.


(trechos de FANTASMAGORIA CARNE, de Paloma Franca Amorim)
- fotos tiradas por Luiza Meira Alves no ensaio do dia 26/jul/2015 durante experimento cênico.