sábado, 28 de fevereiro de 2015

SILÊNCIO! Há uma dúvida acontecendo aqui

POR LIPE LIMA

Hoje o ensaio foi sobre o silêncio.
No clima anárquico de um ensaio sem a diretora, eu e Barbara propusemos aos músicos, Pedro e Caio, um improviso com cara de “sessão aberta”.


IMPROVISO SOBRE O SILÊNCIO
Duração: 50 minutos
Com entradas e saídas
O improviso termina com o alarme do relógio

Aos atores:
Provocação #1: cada ator deve jogar com o universo, as personagens, os acontecimentos, os cenários, as ideias dos 8 contos, como quiser
Provocação #2: dar atenção aos momentos de pausa e movimento, de som e silêncio.
Provocação Infinita: ESCUTA EXTRAORDINÁRIA e SATS PODEROSO

Aos músicos:
Provocação #1: onde há música deixar existir o silêncio e onde há silêncio deixar existir a música.
Provocação #2: deixar a música acontecer como elemento independente na cena, com voz e discurso próprios.


Tentamos reunir nesse improviso algumas das inquietações geradas nos últimos ensaios, a respeito do silêncio, da permanência, do jogar e conter da energia, da pausa.
Convoquei também, durante o improviso, nosso trabalho com os animais totêmicos, tanto na forma explícita quanto na forma disfarçada (falo aqui da questão representação e vivência).
Cada um passou pelos contos que quis e, na cena, pudemos friccionar esses universos, confrontá-los e aceitá-los no mesmo espaço.

Por exemplo, um momento que Barbara era o hipnotizador de Valdemar e eu era Ch’ienniang, existindo no mesmo espaço/tempo da cena, mas em espaços/tempos outros da ficção. Ch’ienniang era Valdemar para o hipnotizador e o hipnotizador era a outra Ch’ienniang.
Aqui ocorreram coincidências na palavra e no movimento, como se os mundos colassem e descolassem rapidamente – pequenos momentos em que dois planos espaço-temporais se encontram. (Barbara citou física quântica aqui)

Testamos “Sozinha com sua alma” com a presença de um narrador. Em determinado momento, Barbara ficou sozinha no espaço e começou a existir na solidão da protagonista. Eu, atrás da estante, em cima de uma cadeira, só com cabeça a vista, comecei a narrar. Transcrevi um trecho do meu texto, na hora:

“Essa mulher teve filhos, teve marido, teve pai e mãe, avô e avó, teve amigos, conhecidos, teve uma vizinha com quem ela fofocava aos domingos de manhã antes de ir a missa, conhecia o açougueiro, o padeiro e gostava de ir ao parque pelas manhãs ver as pessoas correndo. Um a um, ela viu todos desaparecerem.
Essa mulher sofre de solidão, não a solidão burguesa daquele que não consegue se comunicar com outro. Ela está sozinha no mundo e sabe disso, todos os outros estão mortos. Os senhores que observam essa senhora sabem que ela está sozinha no mundo. Todos estão mortos”

Aquele medo de que a presença de um narrador pudesse interferir na força do conto se dissipou. Foi curioso contrapor a solidão da mulher a presença do público. Relativiza a existência dela e a do público. Talvez possa ser um caminho a ser pesquisado e chafurdado.
Também foi valioso abrir a percepção do passado dessa mulher, do que ela passou pra estar sozinha no mundo, de quanto passado ela tem (lembrei da nossa caminhada com Luiza, quando ela perguntou o que a gente leva do passado)

Falamos sobre as pausas que fedem. De como a dúvida pode acontecer pela permanência de algo “estático”. Do nada. Do silêncio em seu estado mais profundo de vir-a-ser qualquer coisa.

Tenho certeza que Barbara pode falar de mais alguns momentos interessantes.

Se tivesse que resumir em uma palavra, usaria a palavra JUSTAPOSIÇÃO.
O mais interessante do improviso foi abrir possibilidades de dissonância e de harmonia entre atores e música, ator e ator, ator e cena.

Pra variar, não tiramos nenhuma foto!


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