POR LIPE LIMA
Hoje o ensaio foi sobre o silêncio.
No clima anárquico de um ensaio sem a diretora,
eu e Barbara propusemos aos músicos, Pedro e Caio, um improviso com cara de
“sessão aberta”.
IMPROVISO
SOBRE O SILÊNCIO
Duração: 50 minutos
Com entradas e saídas
O improviso termina com o alarme do relógio
Aos
atores:
Provocação #1: cada ator deve jogar com o
universo, as personagens, os acontecimentos, os cenários, as ideias dos 8
contos, como quiser
Provocação #2: dar atenção aos momentos de pausa
e movimento, de som e silêncio.
Provocação Infinita: ESCUTA EXTRAORDINÁRIA e SATS
PODEROSO
Aos
músicos:
Provocação #1: onde há música deixar existir o
silêncio e onde há silêncio deixar existir a música.
Provocação #2: deixar a música acontecer como
elemento independente na cena, com voz e discurso próprios.
Tentamos reunir nesse improviso algumas das
inquietações geradas nos últimos ensaios, a respeito do silêncio, da
permanência, do jogar e conter da energia, da pausa.
Convoquei também, durante o improviso, nosso
trabalho com os animais totêmicos, tanto na forma explícita quanto na forma
disfarçada (falo aqui da questão representação e vivência).
Cada um passou pelos contos que quis e, na cena,
pudemos friccionar esses universos, confrontá-los e aceitá-los no mesmo espaço.
Por exemplo, um momento que Barbara era o
hipnotizador de Valdemar e eu era Ch’ienniang, existindo no mesmo espaço/tempo
da cena, mas em espaços/tempos outros da ficção. Ch’ienniang era Valdemar para
o hipnotizador e o hipnotizador era a outra Ch’ienniang.
Aqui ocorreram coincidências na palavra e no
movimento, como se os mundos colassem e descolassem rapidamente – pequenos
momentos em que dois planos espaço-temporais se encontram. (Barbara citou
física quântica aqui)
Testamos “Sozinha com sua alma” com a presença de
um narrador. Em determinado momento, Barbara ficou sozinha no espaço e começou
a existir na solidão da protagonista. Eu, atrás da estante, em cima de uma
cadeira, só com cabeça a vista, comecei a narrar. Transcrevi um trecho do meu
texto, na hora:
“Essa
mulher teve filhos, teve marido, teve pai e mãe, avô e avó, teve amigos,
conhecidos, teve uma vizinha com quem ela fofocava aos domingos de manhã antes
de ir a missa, conhecia o açougueiro, o padeiro e gostava de ir ao parque pelas
manhãs ver as pessoas correndo. Um a um, ela viu todos desaparecerem.
Essa
mulher sofre de solidão, não a solidão burguesa daquele que não consegue se
comunicar com outro. Ela está sozinha no mundo e sabe disso, todos os outros
estão mortos. Os senhores que observam essa senhora sabem que ela está sozinha
no mundo. Todos estão mortos”
Aquele medo de que a presença de um narrador
pudesse interferir na força do conto se dissipou. Foi curioso contrapor a
solidão da mulher a presença do público. Relativiza a existência dela e a do
público. Talvez possa ser um caminho a ser pesquisado e chafurdado.
Também foi valioso abrir a percepção do passado
dessa mulher, do que ela passou pra estar sozinha no mundo, de quanto passado
ela tem (lembrei da nossa caminhada com Luiza, quando ela perguntou o que a
gente leva do passado)
Falamos sobre as pausas que fedem. De como a
dúvida pode acontecer pela permanência de algo “estático”. Do nada. Do silêncio
em seu estado mais profundo de vir-a-ser qualquer coisa.
Tenho certeza que Barbara pode falar de mais
alguns momentos interessantes.
Se tivesse que resumir em uma palavra, usaria a
palavra JUSTAPOSIÇÃO.
O mais interessante do improviso foi abrir
possibilidades de dissonância e de harmonia entre atores e música, ator e ator,
ator e cena.
Pra variar, não tiramos nenhuma foto!
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