domingo, 12 de abril de 2015

Uma casa tomada.

POR LIPE LIMA


CAMBIARSE

Casa Tomada é um Tchekhov argentino.
Irene e eu (não eu que escreve, mas eu que é escrito) assistem a vida passar e não conseguem mudar.
São comprimidos pela força trágica da vida.

Tchekhov diz: Como a vida é dura.
E Cortázar, pra mim, responde: A vida não é dura, ela passa.
Ela passa
e expulsa.
Joga Irene e eu pra rua de onde vieram.
E Eu joga a chave no bueiro.
Pra ninguém
viver a vida de Irene e eu e os pais e o avô paterno e os bisavôs.

Casa Tomada, pra mim, possui muito movimento – precisa ter movimento, precisa ter mudança, precisa ter ação.
Os dois fazem muito, limpam a casa, tricotam, cozinham, devoram livros. Tudo isso é preenchido de sentido, de emoção, de transformação.
Através de todas essas ações, Irene e eu precisam buscar o mundo.
(Mas nada de bom chega a Argentina desde 1939.
Eles estão presos em 1939.
Eles precisam sair de 1939, abandonar os dois pretendentes de Irene e María Esther.)

Irene e eu são frágeis
E se prendem à casa para não desaparecerem
Para não se esvaírem pelo mundo
A certeza deles é a casa
O resto é dúvida.
Dúvida de alma e não de corpo.

A vida os expulsa para as dúvidas.
Despeja-os no mundo
Grita em desespero: MUDEM!

E Irene e eu tentam improvisar
Se esforçam pra mudar
E como num jazz
Se entortam
Se contorcem
Descompassam
Perdem o tom
Que tom?.

(Esse texto vai de Dó menor a Sol maior. Do lento pro rápido. Termina em pausa. Jogar a chave para o mais longe possível)

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